O Brasil, recentemente, com suas matas em chamas, era pauta negativa no cenário internacional. Os governantes de alguns países europeus, como a França, por exemplo, criticaram severamente o comportamento do governo brasileiro por não, segundo entendiam, estar dando a devida atenção ao problema. Afinal, as matas brasileiras, em especial a Amazônia, são um patrimônio da humanidade, o meio-ambiente é responsabilidade de todos e o que acontece aqui repercute por toda a Terra. Interessante e louvável ver a preocupação desses países com as matas brasileiras, com o aumento da temperatura do planeta e com a preservação da vida.
Algo, porém, tem me causado espécie. É que toneladas de petróleo foram derramadas no litoral do Nordeste brasileiro e não temos visto qualquer repercussão dessa tragédia ambiental em âmbito internacional. Nenhum país ofereceu tecnologia ou recursos ao Brasil para limpar o oceano das maledicências provocadas pelo piche. Outra observação é que o “problema do Nordeste” não mobilizou as pessoas (incluindo artistas, políticos, empresários, dentre outras personalidades midiáticas de última hora), especialmente, nas redes sociais, como aconteceu com o incêndio na Amazônia. E só para botar mais lenha na fogueira nesse mar de sujeira (me perdoem o trocadilho), o presidente da República deu declarações na imprensa de que o óleo que vazou “não é do Brasil, não é
responsabilidade nossa”. (Jornal O Globo, 07/10/2019).
Enfim, questionamentos à parte, se o derramamento de petróleo em águas brasileiras foi criminoso ou não, o certo é que esse petróleo é originário de algum lugar, pois não poderia surgir por geração espontânea, óbvio.
Também resta evidente que no Mundo atual, onde a tecnologia é por demais avançada, com satélites “vigilantes” espalhados por todo o Sistema Solar, onde há registros sobre materiais transportados por navios, especialmente quando se trata de uma carga perigosa, como o petróleo, em face justamente da possibilidade de causar danos ambientais, não se pode conceber que não haja indicações ou suspeitas concretas sobre a origem dele (petróleo).
Ora, se o petróleo derramado era transportado de forma clandestina, então estamos diante de um crime, já que não havia autorização para o seu transporte. Porém, se o transporte era identificado, como se presume que fosse, então o país transportador, por uma questão mais que ética, deveria ter se identificado e assumido a responsabilidade. Mas que ética é esta, tão decantada, tão defendida em todo mundo, que é desconsiderada justamente em um episódio de dano ambiental que, como se sabe, traz repercussão para toda a humanidade?
Onde estão os países que se arvoraram como defensores da Amazônia, mas que agora se mantém hermeticamente fechados como se o petróleo derramado fosse mera ficção? O silêncio desses países, em verdade, coloca em xeque suas manifestações na defesa da Amazônia, podendo revelar outros interesses, tal qual afirmara o governo brasileiro.
É triste ver como os interesses pessoais ainda prevalecem, mesmo quando se trata de questões de degradação do meio ambiente que, sem dúvida, deveria importar a todos.
Ulrich Beck, em sua obra “Sociedade de Risco”, publicada ainda em 1986, já vaticinava: “A própria modernização trouxe consequências que estão hoje arriscando as condições básicas de vida alcançadas por via desse mesmo processo. (…) Uma civilização que ameaça a si mesma, na qual a incessante produção de riqueza é acompanhada por uma igualmente incessante produção social de riscos globalizados que atingem da mesma forma todas as nações, sem distinção. (…) A incerteza produzida pela Sociedade de Risco expressa a acumulação de riscos – ecológicos, financeiros, militares, terroristas, bioquímicos, informacionais, que tem presença esmagadora hoje em nosso mundo. (…) A consciência do risco global cria espaço para futuros
alternativos, modernidades alternativas. Os riscos globais abrem um novo espaço de discussão moral e política capaz de fazer surgir uma cultura civil de responsabilidade globalizada”.
Parece que, passados mais de 30 anos da publicação daquela obra, o mundo ainda não se deu conta efetiva dessa cultura civil de responsabilidade globalizada. Enquanto isso, o Brasil que zele por suas matas, seus mares e suas riquezas.
Responsabilidade Socioambiental: um dos Valores do Poder Judiciário do Brasil
Sabe-se que a Constituição Federal de 1988 assegura o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado nos termos do artigo 225 (BRASIL, 1988). Sendo assim, tem-se que a apreciação do tema ganha dimensões gigantescas, pois atinge a sociedade como um todo.
Note-se que a Resolução 198 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), nos termos do anexo, ao instituir a Estratégia Nacional do Poder Judiciário, elenca os atributos de valor para a sociedade, dentre eles: a responsabilidade socioambiental.
Os aludidos valores devem ser observados pelos órgãos do Poder Judiciário contidos nos incisos II a VII do artigo 92 da Constituição Federal de 1988, a saber: Superior Tribunal de Justiça, Tribunal Superior do Trabalho, Tribunais Regionais Federais e Juízes Federais, Tribunais e Juízes do Trabalho, Tribunais e Juízes Eleitorais, Tribunais e Juízes Militares, Tribunais e Juízes dos Estados e do Distrito Federal e Territórios; bem como pelos Conselhos da Justiça.
Nesse viés, vale lembrar que a Recomendação nº 11, de 22 de maio de 2007, do Conselho Nacional de Justiça, sugere a adoção de “políticas públicas visando à formação e recuperação de um ambiente ecologicamente equilibrado, além da conscientização dos próprios servidores e jurisdicionados sobre a necessidade de efetiva proteção ao meio ambiente, bem como instituam comissões ambientais para o planejamento, elaboração e acompanhamento de medidas, com fixação de metas anuais, visando à correta preservação e recuperação do meio ambiente. (CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, 2007, n.p.).”
Assim, verifica-se que a Responsabilidade Socioambiental engloba setores estratégicos da administração política do País, ressaltando-se, nessa análise, o Poder Judiciário.
Salienta-se que a Responsabilidade Socioambiental relaciona-se com os conceitos de sustentabilidade. Por conseguinte, na obra Ética Ambiental, Nalini (2010) explica que “a sustentabilidade importa em transformação social, sendo conceito integrador e unificante. Propõe a celebração da unidade homem/natureza, na origem e no destino comum e significa um novo paradigma. Não há necessidade de se renunciar ao progresso, para a preservação do patrimônio ambiental”. (NALINI, 2010, 125).
Esse estudo tendeu a averiguar a percepção do Poder Judiciário do Brasil, quanto aos seus atributos de valores perante a sociedade, especificamente no que tange à Responsabilidade Socioambiental.
Arremate-se que a Responsabilidade Socioambiental é concretizada pelo Poder Judiciário mediante a criação e a aplicação do Plano de Logística Sustentável (PLS) pelos respectivos tribunais brasileiros supracitados.
Resta claro, portanto, que a Responsabilidade Socioambiental é matéria discutida com ampla notoriedade, e é importante refletir sobre tal temática no espaço contemporâneo, já que consiste em um dos valores do Poder Judiciário do Brasil. *Erica de Sousa Costa, Advogada.