Profissional atuante e engajada em causas sociais, a advogada trabalhista Noélia Sampaio assumiu, recentemente, mais um desafio: presidir a Associação dos Advogados Trabalhistas do Estado do Piauí (AATEPI), considerada a maior em número de associados. Nesta entrevista, ela fala um pouco sobre sua trajetória na advocacia, os desafios da carreira e os planos para a entidade. Também fala sobre o papel da mulher advogada no Brasil e no Piauí e destaca a importância da Resolução 5/20, aprovada no final do ano passado, que altera o Regulamento Geral do Estatuto da Advocacia e da OAB e estabelece a paridade de gênero (50%) e a política de cotas raciais para negros (pretos e pardos), no percentual de 30%, nas eleições da Ordem dos Advogados do Brasil.

 

 

CAMPELO FILHO: Dra. Noélia, você tem um trabalho muito forte em Comissões, especialmente naquelas voltadas às causas femininas, qual a motivação para esse trabalho?

ADV. NOÉLIA SAMPAIO: Comecei a participar de comissões logo que me formei, em 2008. A primeira foi na comissão de promoção da cidadania, onde fazíamos um trabalho externo junto às comunidades, nas escolas… Daí, participei de outras, chegando à vice-presidência de uma comissão nacional. À medida que conhecia o trabalho e me identificada com a temática, me envolvia mais ainda. Foi o caso da comissão de defesa da mulher. Passei a estudar a questão de gênero, dos tipos de violência sofridos, da desigualdade, passei a participar de eventos que tratavam sobre o assunto, de movimentos feministas, e esse aprendizado faz com que tenhamos um olhar ampliado sobre o tema e sobre a história, as motivações. A gente aprende também a reconhecer e vê que isso acontece em todos os segmentos sociais, na própria constituição familiar, no trabalho, etc. Todo esse conhecimento e envolvimento faz com que assumamos posições e tomemos atitudes. É aí que entra a questão do empoderamento feminino que, para mim, é uma forma de barrar, principalmente, a violência. Através de iniciativas, de formas de abordagens saudáveis, e de conhecimento, a gente consegue ajudar muitas mulheres.

CAMPELO FILHO: Qual o cenário da mulher advogada no Brasil e, especialmente, no Piauí?

ADV. NOÉLIA SAMPAIO: Atualmente, no Piauí, são mais de 20 mil advogados e advogadas inscritos. Neste universo, cerca de 12 mil são militantes e destes, cerca de 6 mil são mulheres. Em nível nacional as advogadas já ultrapassam o número de advogados, mas aqui, no Piauí, ainda não ultrapassamos. Apenas em 10 estados do Brasil, elas são maioria. Aqui, estamos ainda na média de 50/50. Então, não só na advocacia, mas em qualquer segmento, nós mulheres temos sempre que fazer mais, que mostrar mais resultados.  Um exemplo do quanto a intervenção de uma mulher é importante e faz diferença é nos casos de assédio. As mulheres vítimas desse tipo de violência se sentem mais à vontade ao serem atendidas por advogadas. Elas conseguem se abrir e conversar conosco, pela maneira como conduzimos a situação, pela compreensão e sensibilidade na abordagem que fazemos em relação ao tema.

CAMPELO FILHO: Como você vê a decisão sobre a paridade de gênero e cota racial nas eleições da Ordem?

ADV. NOÉLIA SAMPAIO: De fato, considero que é um avanço, só que desde 2015 já há um provimento que dá por determinado que 2016 seria o ano da mulher advogada. De lá para cá já se passaram duas gestões e nós não temos uma mulher na diretoria do Conselho Federal. Também não temos nenhuma mulher presidente de seccional, a exceção é na Amazônia, mas isso porque o presidente eleito renunciou e a sua vice assumiu. Das 80 cadeiras no Conselho, só tem dezenove mulheres titulares. Diante desse cenário, a gente se pergunta: cadê essas mulheres? Então, em termos de legislação estamos bem, porém, de 2015 para cá, nós não vemos isso de forma efetiva, na prática. Agora, com esta nova legislação, eu espero que esse cenário mude, porque é obrigatório ter 50% de mulher. Do contrário, não poderá registrar chapa. Eu espero que essa nova lei promova também mais empatia e conscientização sobre a trajetória do nosso trabalho e importância do nosso papel na sociedade. A gente precisa desmistificar muita coisa em relação ao papel da mulher e sua capacidade de representatividade. Acho que é isso que falta para que a mulher advogada assuma esse protagonismo.

CAMPELO FILHO: Você assumiu, agora, a Associação dos advogados trabalhistas do Piauí (AATEPI). O que a classe pode esperar da sua gestão?

ADV. NOÉLIA SAMPAIO: Eu sou a segunda advogada presidente da associação. A primeira foi a Dra. Osma, que fez um excelente trabalho. Hoje, a AATEPI é a maior do estado do Piauí. Temos outras associações: Previdenciários, civilistas, enfim, mas a nossa é a maior, com mais de 500 associados e de perfis diversificados: jovens advogados, outros mais experientes, em número de mulheres somos maioria, contamos também com três ex-presidentes que são exemplos de gestão. Então, tenho consciência da responsabilidade que terei pela frente e a minha linha de trabalho é a de mantermos um diálogo aberto, inclusivo e de fortalecimento de relações com o judiciário, com a OAB, com o MPT, dentre outras instituições, de modo a promover esse bem social, estimular uma maior participação, ampliar o número de associados fortalecendo a nossa representatividade e atuação em todo o estado. Assim, também conseguiremos promover uma melhor conscientização sobre a atuação da advocacia trabalhista. Porque é uma cadeia: quando o advogado trabalhista tem o seu retorno da justiça, consequentemente, ele atende o empregado e a empresa, o reclamante e o reclamado. Nosso papel é ser esse intermediário entre a advocacia e a justiça para promover um bem-estar maior.

Entrevista publicada, originalmente, na edição do dia 15/05/2021 no Jornal O Dia