Normalmente costumo dar título aos artigos após escrevê-los, o que é natural, considerando que os pensamentos vão se desenvolvendo e se delineando ao longo do texto, muitas vezes tomando caminhos outros que os pensado inicialmente. Neste, todavia, já saí logo com “as incongruências de uma nação esfacelada…” encabeçando. Reputei fácil escrever sobre esse tema que me surgiu após algumas leituras prévias de textos do ex-ministro da Fazenda Ernane Galvêas, publicados na revista Carta Mensal da Confederação Nacional do Comércio – CNC. As incongruências no Brasil, porém, para um observador mais atento, estão expostas às escâncaras e algumas são históricas, se repetem, e não se vê luz que aponte para o fim das mesmas.
Por exemplo: riqueza x pobreza. Ora, na maior parte do mundo sempre houve e continuará a existir essa dicotômica relação e isto não se caracteriza como uma incongruência per si, pois diversos fatores têm influência nessa diferenciação social e econômica. Este não é o ponto que quero abordar.  A questão fulcral, assim, não é a dualidade (ricos e pobres), mas o distanciamento, o afastamento, o abismo cada vez maior que os separa e que avança sem freios nem paliativos.
A incongruência aqui apontada, desse modo, não está no fato de existirem ricos e pobres, mas sim no fato de se permitir que isto se acentue cada vez mais, ao invés de se buscar diminuir a distância que os separa, especialmente quando estamos em um país onde ainda é possível se encontrar milhões e milhões de reais em cédulas dentro de malas em uma sala de apartamento, oriundos de propinas e corrupção. De um país que possui terras férteis e água abundante como nenhum outro, em um país que se arrecada em poucas semanas (em apostas da loteria) mais do equivalente a um milhão de reais por brasileiro (pode incluir os brasileiros que estão nascendo enquanto alguém lê este artigo).
A incongruência se exacerba quando milhares de pessoas vivem nas ruas, sem moradia digna e outros tantos morrem à míngua nos hospitais públicos. Quando o índice de analfabetismo é gritante a educação é um faz de conta para inglês ver ou mesmo quando a violência passa a dominar o Estado a ponto deste não saber como combatê-la, com pessoas morrendo diariamente vítimas de latrocínios e homicídios.
Já que toquei no tema da educação, facilmente posso citar outra incongruência, desta feita colhida dos dados do ex-ministro da Fazenda acima referido, onde informa que no Ministério da Educação o número de funcionários aumentou de 188,4 mil em 2008 para 288,3 mil em 2016, tendo os gastos orçamentários, em termos reais, uma expansão de 95% em oito anos. A incongruência que me refiro não está no aumento de pessoal ou de gastos, mas no fato de que Brasil há aproximadamente dois milhões de jovens que nem trabalham nem estudam e mais de um milhão de menores de 17 anos que não estão na escola.
A incongruência está ainda no fato de que, segundo levantamento da OCDE (Organização para Cooperação de Desenvolvimento Econômico), 43,7% dos jovens brasileiros entre 15 e 16 anos que estão na escola declararam exercer algum tipo de trabalho remunerado em suas rotinas. Na Coréia do Sul, esse índice é de apenas 5,9%!
Se ainda não bastasse, os resultados do Brasil no Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (Pisa, na sigla em inglês), mostram uma queda de pontuação nas três áreas avaliadas: ciências, leitura e matemática, sendo que o Brasil caiu no ranking mundial: o país ficou na 63ª posição em ciências, na 59ª em leitura e na 66ª colocação em matemática. E o que dizer se o Brasil está entre as dez maiores economias do mundo?
Infelizmente, muitas são as incongruências que poderia citar e como disse no início seria fácil, o que comprova o esfacelamento da nação. O mais importante, porém, é observar que em um país com tantas incongruências, em um ano que o povo irá mais uma vez às urnas, os debates continuem a se dar longe do que efetivamente importa. Promessas gerais, abstratas e falaciosas devem ser a tônica das campanhas eleitorais, enquanto o país continuar a replicar suas incongruências (já crônicas), longe de se realizar um debate profundo sobre os problemas, suas causas e eventuais soluções.   Mas e daí? Afinal, o Brasil é ou não é o país do carnaval e do futebol? E ainda é janeiro e a copa do mundo da FIFA em junho. É, tive que acrescentar algo mais ao título, como se viu!