
Estamos vivendo um momento crucial na história da humanidade, como já tenho assinalado em outras oportunidades. E é fato inconteste que, em que pese o tamanho do planeta Terra, parece não haver espaço para toda a população e tampouco alimentos. Que o digam os milhões de pessoas que têm migrado em busca de melhores condições de vida, de um espaço onde possam viver em paz e com dignidade. Outros tantos passam por necessidades extremas e, em situação de miséria, vivem em condições de degradação humana.
Em 1968, há quase 60 anos, na revista Science, o biólogo Garrett Hardin publicou pequeno ensaio intitulado “The TragedyoftheCommons” (A Tragédia dos Comuns), expondo o risco da exploração livre de um recurso natural finito. Hardin explica que se as pessoas passarem a utilizar individualmente um recurso em benefício próprio, sem pensar coletivamente, ou sem qualquer tipo de controle, o bem terminará por ser extinto, impossibilitando a continuidade de produção e o aproveitamento do recurso por todos. Parece óbvio, por certo! Se a pesca é livre, por exemplo, e é exercida de forma indiscriminada e sem regulamentação qualquer, se tornará predatória e em face da sobre pesca, algum tempo futuro, não haverá peixes.
Mutatis mutandis, a obviedade da análise inicial se torna bastante complexa quando, em um cenário de globalização, o consumo torna-se desenfreado, as fronteiras geográficas se abrem e os recursos naturais se tornam cada vez mais escassos.
Veja-se, para citar apenas alguns exemplos,o problema das águas, com a superexploração de aquíferos e desperdício de água, aliada à falta de chuvas e o excesso de utilização de energia elétrica por uma superpopulação;a extração predatória de madeira; queima de combustíveis fósseis e consequente aquecimento global; e a destruição de habitats e a caça clandestina e predatória de diversos animais, como a de baleias pelo Japão.
Seria a desglobalização uma alternativa? O fenômeno da globalização, tão decantado na década de 1980 como uma nova ordem que solucionaria os problemas mundiais, especialmente de natureza social e econômica, teria fracassado? O vaticínio de Hardin em sua tragédia dos comuns estaria se concretizando? Por certo que não há respostas claras e concretas para estas perguntas, sendo importante, todavia, se debater sobre elas, sem ignorar que os problemas apontados fazem parte da ordem do dia, sob pena da tragédia dos comuns se tornar na tragédia dos homens, e isto ninguém, com razoável bom senso, pode desejar que ocorra!
*Texto publicado originalmente na edição do dia 07 de dezembro de 2017 do Jornal O Dia.
Segundo o artigo 1º da Constituição Federal de 1988, o Brasil constitui-se em um Estado Democrático de Direito, tendo o artigo 2º estabelecido que são Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário. É certo, porém, que a independência desses poderes não é absoluta, encontrando limites estabelecidos na própria Constituição, sendo permitido fazer apenas aquilo que ela (Constituição) determinar. Ao Poder Legislativo cabe, dentre outras funções, fazer as Leis que devem reger a vida em sociedade, estabelecendo condutas, direitos e deveres, mas respeitando sempre os limites e determinações da Constituição Federal. Assim, nesse sistema de democracia constitucional, ao Supremo Tribunal Federal – STF cabe precipuamente a guarda da Constituição, devendo zelar para que as eventuais Leis que venham a ser criadas não a contrariem.
Em levantamento realizado pelo Anuário da Justiça sobre o julgamento das ações diretas de inconstitucionalidade (ADIs) pelo STF em 2017, de cada dez leis analisadas, oito delas foram declaradas inconstitucionais, parcial ou totalmente. Os vícios que culminaram com as inconstitucionalidades são principalmente os que dizem respeito à forma com que foram editadas, mas muitas também têm relação com o conteúdo. Em fevereiro de 2018, de acordo com dados do STF, havia 2.040 ADIs em tramitação na corte, pasme!
É preciso observar que o STF não age de ofício, ou seja, só declara a inconstitucionalidade de uma lei se for provocado, na forma do que também estabelece a Constituição Federal, sendo possível, pois, que existam inúmeras inconstitucionalidades não declaradas pelo país, considerando que há ainda as assembleias legislativas estaduais e câmaras municipais fazendo leis todos os dias, isso sem contar a competência legislativa no âmbito dos governadores de estado e de prefeitos municipais.
A reflexão que fazemos, aqui, se relaciona com a habilidade dos legisladores brasileiros de fazerem leis, afinal como se conceber uma estatística negativa tão elevada no âmbito do Poder Legislativo, quando cada senador, deputado federal, estadual ou vereador conta em seus gabinetes, uns mais outros menos, com uma plêiade de assessores e com toda uma estrutura das casas legislativas, formadas por profissionais das mais diversas áreas, prontos para emitirem pareceres, orientações técnicas, enfim.
Se esses legisladores fossem empregados de uma empresa privada por certo muitos já estariam desempregados, seja por produzirem pouco, seja por produzirem mal ou equivocadamente, como por ocasião da elaboração de leis inconstitucionais. A questão, todavia, é que enquanto empregados do povo, foram escolhidos através das urnas, não tendo como demiti-los por incompetência, tal qual ocorreria se se tratasse de algum empregado qualquer.
Ainda trazendo a empresa privada como analogia, se um empregado no exercício de sua atividade causar dano a terceiro, a empresa será responsável pela indenização, não interessando a qualidade do empregado contratado, considerando ser problema da empresa se contratou mal. É a chamada culpa in eligendo ou simplesmente culpa pela escolha. À empresa fica a possibilidade de imediatamente demitir o empregado que não agiu bem!
Quando o povo escolhe mal seus governantes e estes agem mal, legislando sem observar sequer as regras de legislação, a culpa in eligendo atua perfeitamente também, e o povo arca com os prejuízos que são causados pelo legislador, mas diferentemente do que ocorre na iniciativa privada, o povo não tem como demitir o mau legislador imediatamente. É que a demissão só poderá ocorrer nas urnas, de quatro em quatro anos.
Não se pode esquecer que uma lei mal feita pode trazer sérios e graves prejuízos, inclusive e especialmente prejuízos sociais. Leis podem retirar direitos conquistados, usurpar competências, fechar escolas ou hospitais. São variadas as consequências, sendo essencial que o povo as compreenda efetivamente.
Defendemos que o povo tenha o direito, tal qual ocorre na iniciativa privada, de demitir aquele político que uma vez eleito não corresponda às expectativas. Seria importante fossem fixadas metas aos eleitos, fossem analisadas as propostas das campanhas e cobradas o cumprimento delas.
Eleger não pode significar um cheque em branco, uma procuração com poderes absolutos, muito menos a impossibilidade de revoga-la tão logo seja preciso. Da mesma forma as urnas não podem ser um escudo de proteção, um colete à prova de tudo, inclusive em face do povo, que em verdade é (deveria ser) o verdadeiro dono do Poder, afinal é a própria Constituição Federal que estabelece que todo o poder emana do povo.
Nesse diapasão, o povo deve compreender que ao escolher legisladores ruins está assumindo uma responsabilidade muito grande, da mesma forma que uma empresa que contrata um empregado negligente ou incompetente, com a diferença de que o empregado pode ser demitido a qualquer tempo.