A maior parte dos usuários de Internet brasileiros (62%) acessa a rede exclusivamente pelo celular, realidade de mais de 92 milhões de indivíduos. Outro dado mostra que mais da metade (51%) dos entrevistados fez consultas, pagamentos ou outras transações financeiras na Internet em 2022, um aumento de 5 pontos percentuais em relação ao ano anterior (46%), ocorrido sobretudo entre os usuários das classes C (de 45% para 51%) e DE (de 21% para 26%). Usuários das classes A (90%) e B (73%) seguem realizando essa atividade em maiores proporções. A conclusão é da TIC Domicílios 2022, pesquisa lançada em maio deste ano pelo Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br) e realizada pelo Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação (Cetic.br) do Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto BR (NIC.br),
Dizer que a nossa vida cabe na palma da mão não é um exagero, uma figura de linguagem. E olhe que a vida é complexa! Mas as novas tecnologias, a internet, as mídias sociais, a inteligência artificial e mais uma infinidade de outras descobertas tecnológicas e ferramentas de comunicação, realmente, são capazes de “simplificar” essa complexidade da vida e colocar tudo dentro de um celular. E sem entrar no mérito do bom ou ruim, do perigoso ou não, sobre essa fragmentação de nós mesmos, por meio da exposição dos nossos dados pessoais na rede, é preciso responsabilidade, vigilância sobre o quê, como e para quem comunicamos, e o mais importante: para qual fim esses dados serão utilizados. Claro que não é fácil esse controle e já sabemos disso faz muito tempo, até porque, nos dias atuais, já não precisamos nem mais escrever, basta falar e nossos desejos aparecerão na forma de ofertas encantadoras via tela do celular.
Temos responsabilidades como titulares de dados sobre tudo isso, sim. Mas qual o papel do setor público, suas autoridades e instituições na garantia dos direitos relacionados à privacidade e à proteção de dados pessoais do titular? Se por um lado cada um de nós, individualmente, deve ser rigoroso e criterioso sobre as informações que passamos a nosso respeito, por outro lado, o que estão fazendo instituições públicas e privadas para regular e fiscalizar o tratamento de dados pessoais, no sentido de assegurar o uso adequado de dados dos cidadãos para a realização de suas atividades, como a prestação de serviços públicos ou a venda de algum produto, só para citar dois exemplos? Qual é a percepção do cidadão/consumidor comum sobre essas responsabilidades?
A Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), apesar dos seus quase cinco anos em vigor, ainda enfrenta desafios na sua implementação. O que dirá no seu monitoramento, fiscalização, vigilância e, consequentemente, na garantia de que dados pessoais disponibilizados por titulares a empresas públicas ou privadas estejam seguros e livres de vazamentos? Em poucas palavras, estamos falando de confiança. Na verdade, no nível de confiança dos usuários de internet no ambiente digital. Sobre o assunto, vale reproduzir aqui, trecho do artigo “Perspectivas da sociedade brasileira em relação à privacidade e à proteção de dados pessoais”, de autoria de Winston Oyadomari, bacharel em Administração Pública; Ramon Silva Costa, doutorando em Direito; e Manuella Maia Ribeiro, doutora e mestre em Administração Pública e Governo; disponível no cetic.br.
A avaliação é a partir da pesquisa “Privacidade e proteção de dados pessoais 2021: perspectivas de indivíduos, empresas e organizações públicas no Brasil (CGI.br, 2022)”, realizada pelo Cetic.br|NIC.br com usuários de Internet, que mostra como a população entende a temática de privacidade e proteção de dados e se posiciona frente a temas como as práticas de coleta de dados e os riscos percebidos nessas operações.
As conclusões apontadas abordam temas como a governança de dados. Para os autores a área desempenha um papel fundamental na gestão eficaz das informações, estabelecendo políticas e práticas para garantir qualidade, conformidade e uso adequado dos dados. Nesse contexto, a proteção de dados pessoais assume uma importância central, pois busca preservar a confidencialidade, a integridade e a disponibilidade das informações, mitigando, por exemplo, riscos de acesso não autorizado, perda ou uso indevido.
Outra análise aponta para o receio dos usuários de internet quanto ao uso dos seus dados, especialmente os de natureza sensível. Já em relação ao contato com organizações para denunciar ou buscar direitos relacionados à proteção de dados, além das entidades controladoras de seus dados, os usuários de Internet citam mais frequentemente órgãos de defesa do consumidor e autoridades policiais como o locus de denúncias ou reclamações. Geralmente, a ANPD ainda não é percebida como um espaço de interação para esse tema entre os usuários de Internet.
Outro ponto mencionado na pesquisa é quanto aos dados biométricos, os mais mencionados entre os investigados como tipo de informação sensível que preocupa os usuários de Internet. Isso demanda uma reflexão por parte de organizações públicas e privadas sobre as estratégias para sua coleta e seu processamento.
Por fim, um resultado surpreendente levantado pela pesquisa é a restrição feita por usuários de Internet sobre seu próprio comportamento, motivados pela preocupação com o uso de seus dados. Isso demonstra que usuários podem optar por não realizar serviços por canais digitais devido a receio da coleta e uso de seus dados, impactando a prestação de informações e serviços públicos pelos meios digitais. Além disso, preocupação quanto a ciberataques, fraudes, segurança, falta de transparência no uso de dados, entre outros, podem diminuir a confiança nos serviços de governo e afetar sua adoção pela sociedade (Departamento de Assuntos Econômicos e Sociais das Nações Unidas [UN DESA], 2022).
Para concluir, a adoção de práticas voltadas para gerar maior confiança no uso de aplicações digitais torna-se fundamental para as estratégias e os modelos de governança de dados adotados pelas organizações públicas. Nesse sentido, os resultados ajudam a reforçar a importância do tema para o debate público e lançam novas perguntas que deverão ser endereçadas por futuros estudos sobre privacidade e proteção de dados pessoais no país, especialmente para a promoção da boa governança de dados.
(Com informações CETIC.BR)